quinta-feira, julho 20, 2006

VI

Manhãzinha acordei com as andorinhas em bandos nos beirais construindo os ninhos. O seu chilrear imenso transmitia a paz que à muito não sentia.
Espaço, liberdade, ócio. A imaginação assim desperta vai em voos rasantes, e lentamente os olhos vão-se habituando à claridade dominante.
Tinha de ser, vencer a preguiça, levantar.
Dar um banho de água tépida, para que a dor de costas constante e habitual se atenuasse. Que bom a água tépida correndo no corpo. Mirei-me ao espelho, o cabelo húmido colado à testa, a barba já grande pedia para ser cortada, demorou pouco, um pouco de after-shave e já está.
Tinha de me despachar, hoje queria escutar-te na tua intervenção, apresentavas a tua comunicação da parte de manhã. Queria estar presente tu sabes.

Agarrei a pasta, corri porta fora, sentia fome, um apetite exagerado ao início da manhã. Assim para equilibrar o organismo devorei num ápice o croassant e a meia de leite que me serviram. As jornadas já se tinham iniciado.
Será que já lá estavas? Hoje era o dia da tua apresentação, expectante, eu não podia perder o momento, de maneira nenhuma!
Olhei, não sei quantas vezes o relógio, os minutos pareciam horas…Estava impaciente acho. Que longo o caminho até ao auditório...
A sala cheia ou quase. Mirei um lugar bem na frente, uma cadeira vazia esperava por mim, reservada por alguém com poderes mágicos e invisíveis.
Procurei-te com o olhar, uma e outra vez, não te vi na assistência.
- Que parvo! – Olha o que me fazes com a tua presença, deixo de ficar lúcido!
Estavas na mesa, dentro em pouco fazias a tua apresentação, ao redor do Porto e do seu Património. Gostei de te escutar, o à vontade com que explanavas as tuas ideias. Denotavas um domínio profundo do tema, um à vontade que à primeira vista colidia com a tua figura de menina, mas mulher segura. A assistência interessada em silêncio escutando a tua dissertação sobre o tema.
Fiquei emocionado contigo, olhaste para mim, e o teu olhar mandou-me um beijo, retribui a carícia. -- Quero dizer que te amo, para que saibas!
Amei-te nesse instante, não o sabia, mas mais tarde esse amor revelou-se. Mais tarde. Estava a aprender a conhecer-te. Estava ainda a refazer-me da surpresa da tua presença.

O almoço por conta da organização foi excelente, ao redor de pratos típicos, o peixe fresco estava delicioso. Bem regado por um vinho branco da região. As conversas em cada mesa divagavam em temas vários. Não sabia onde te encontravas, procurei-te com o olhar, notava-se. Em tua busca qual radar procurando um ponto de referencia no ecrã plano que me indique as coordenadas para não te perder…
Não te vi. O meu radar estava cego como se diz em gíria marítima…Suava copiosamente, a camisa colada ao corpo. Como apetecia dar um mergulho no Guadiana.
Tarde quente, o ar perfumado do cheiro a frutos tão característico do Algarve, misturado aqui e ali por cheiros a carvão e peixe assado na brasa, memórias de vinte anos passados….O ar impregnado de sons, andorinhas velozes chilreando felizes em bandos pouco interessadas nas lutas diárias e constantes que se travavam no interior de cada um. O amor andava no ar… E não sei de ti!

5 comentários:

Teresa Durães disse...

Vim aqui parar num acaso. Li aqui e ali. Gostei da escrita.

Voltarei.

Ana Luar disse...

Acho que assim como se fosse um conto inventado a história de amor ganha outra vida... renasce em cada palavra!

Adorei mar!

© Piedade Araújo Sol (Pity) disse...

....isto continua, João? quero ler o resto...

Su disse...

faz tempo que não passava por aqui.
hoje li, reli. gostei .
o poder das palavras.... a lucidez ou não... da presenca da ausencia
somos agarrados por elas.palavras. ou são elas que nos agarraram... não há coincidencias.
há recorrencia. nas palavras.
qd a sedução bate à porta já dizia o.w. quem geralmente atende é a imaginação....e aí vamos nós....juntamente com as palavras.... que são tantas....e que dependem sempre do lado em que está o sol...........ou a falta dele.............

jocas maradas deste lado do mar

Mikas disse...

L'amour toujours l'amour... sem ele de que valeria acordar de manhã e correr para viver?