…Há um grande cansaço na alma do meu coração. Entristece-me quem eu nunca fui, e não sei que espécie de saudades é a lembrança que tenho dele.
Caí contra as esperanças e as certezas, com os poentes todos.
…Estou hoje lúcido como se não existisse. Meu pensamento é em claro como um esqueleto, sem os trapos carnais da ilusão de exprimir. E estas considerações, que formo e abandono, não nasceram de coisa alguma - de coisa alguma, pelo menos, que me esteja na plateia da consciência.
Talvez aquela desilusão do caixeiro da praça com a rapariga que tinha, talvez qualquer frase lida nos casos amorosos que os jornais transcrevem dos estrangeiros, talvez até uma vaga náusea que trago comigo e me não explico fisicamente…
Disse mal o escoliasta de Virgílio.
É de compreender que sobretudo nos cansamos.
Viver não é pensar…
In livro do Desassossego, Bernardo Soares
Imagem, Google
8 comentários:
'Sei de um rio' onde liberto todo o meu cansaço...
Um beijo, daqui
Ah Bernardo Soares e todos os teus eus, a náusea que sentimos é ética e doi.
Viver é agir,de modo que havemos de encontrar a página...
isto é o fim?
A metamorfose da esperança em vazio.
Marinheiro
os teus desasossegos são tão sublimes quanto os do Bernardo.
Faltam-me. e a ti também.
beijo. porque os adeuses existem. Há céus por desvendar.
"y aqui me quedo"...
Abraço-te
... Álvaro de Campos e Bernardo Soares ..sao os meus preferidos do Pessoa :)
Viver não é pensar...é ter duvidas...
"Meu pensamento é em claro como um esqueleto, sem os trapos carnais da ilusão de exprimir"...
Que chatice, que as melhores frases já tenham sido escritas!!! ;-)
Muito bom!
Confesso que, enquanto lia, não me lembrava de o já ter lido. Já tinha, factum est, mas não me lembrava, por acaso. E então, quando terminei o parágrafo que inicia por "talvez", quase que me saía um - "Epáaa, qual Hemingway, qual quê!!!". Estava a fazer contas de te elogiar a escrita, vê lá! E o culpado és tu, que nos vais enganando! :-)
... Um dia ainda tens que casar aqui com a malta toda! ;-)))
Um beijo, meu caro João!
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